Alguns dizem 30, outros 60, 90 e até 180 dias, enquanto uns falam em 2 meses ou que sequer existe prazo.
Publicado por Paulo Henrique Brunetti Cruz - 1 dia atrás
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Afinal, qual é o prazo para fazer inventário após o falecimento de alguém? Essa é uma dúvida constante que respondo às pessoas que me procuram para abertura do procedimento, seja ele em cartório/extrajudicial (para saber mais sobre inventário em cartório, leia também este outro artigo meu) ou judicial.
O mais interessante é que a maioria delas já chega me dizendo um prazo que ouviu falar ou que recebeu como instrução de alguém (muitas vezes de juristas[1]). Uns dizem ser de 30, outros de 60, 90 e até 180 dias, enquanto alguns pensam que são 2 meses[2], ou mesmo que não há sequer prazo.
Está colocado o problema: o cidadão comum[3] recebe a cada hora uma informação diferente sobre o prazo. Qual a solução? Em que ou em quem confiar? Meu objetivo neste artigo é levar até você uma resposta segura e bem fundamentada sobre o prazo para abrir um inventário, que pode ser usada facilmente por qualquer pessoa, não apenas por juristas. Não se assuste ao ver referências a Códigos, leis, etc.. Confie em mim: ao final, concluirá que a solução é bem mais simples do que se esperava e que tem muita repercussão financeira.
1) Enfim, qual é o prazo?

Como para toda boa explicação é preciso um bom exemplo,ilustrarei a situação com a hipótese de um inventário a tramitar no Estado de Minas Gerais. Haverámudanças sensíveis de Estado para Estado, mas a lógica aplicada é a mesma.
De acordo com o Código Civil, o prazo seria de 30 dias[4]. Segundo o Novo Código de Processo Civil, mais recente que oCódigo Civil, seria de 2 meses[5]. Já a Lei do Estado de Minas Gerais no. 14.941/03 fala em 180 dias[6]. Qual é o correto?
Em primeiro lugar, o prazo do Código Civil sofreu revogação tácita pelo Código de Processo Civil, já que este é mais novo. Assim, vigora hoje não o prazo de 30 dias, mas o de 2 meses.
2) E se eu passar do prazo, o que acontece automaticamente?

A resposta, que parece que poucos enxergam, é, a princípio, nada, inclusive no exemplo citado (inventário feito em Minas Gerais). Isso contraria o que muitos advogados incutem nas mentes de seus clientes, de que, passado esse prazo, acontecerá algo ruim automaticamente.
Acontece que o tributo incidente (ITCD) é estadual, todavia, os Estados devem obedecer à legislação federal (no caso, aoCódigo de Processo Civil), o qual não traz qualquer penalidade pela inobservância do prazo para abertura do inventário.
Na verdade, o que a lei faz é somente proibir que os Estados cobrem qualquer multa dentro desse prazo (veja-se, é uma proibição aos Estados, não às pessoas).
Em outras palavras, o Código de Processo Civil somente veda que os Estados cobrem qualquer tipo de multa em até 2 meses após o óbito, sem, contudo, colocar qualquer tipo de pena para quem fizer inventário depois deste prazo.
3) Mas após o prazo, pode acontecer alguma coisa ruim?

Sim, mas não é automático. Como mencionado, o Código de Processo Civil (que é uma lei federal) deixa a cargo dos Estados, passados os 2 meses, a possibilidade de cobrarem o ITCD (de competência estadual) com multa, SE os Estados quiserem.
Como se nota, o Estado não está obrigado a cobrar multa tão logo acabe o prazo de 2 meses.
É exatamente aqui que entra o prazo de 180 dias que consta na Lei do Estado de Minas Gerais nº. 14.941/03, tomado como exemplo. Ultrapassando-se, então, 180 dias, aí sim a Receita Estadual cobrará multa[7].
Não fosse o bastante, poucos profissionais dominam a fundo as legislações estaduais sobre o tributo. Em Minas Gerais há um desconto muito interessante para quem paga o ITCD antes dos 180 dias. Há um desconto de nada menos que 15% sobre o imposto, desde que ele seja recolhido em até 90 dias após o falecimento[8] (outros Estados concedem o mesmo benefício, mesmo após os 2 meses).
Trazendo para termos práticos, suponha que o (a) falecido (a) tenha deixado um patrimônio de R$ 2 milhões. O imposto a recolher seria de R$ 100.000,00 (5%, em MG), porém, com o desconto, a economia ao cliente seria de R$ 15.000,00.
4) E se tiver ultrapassado todos os prazos, não poderei fazer o inventário?

Desde que não tenha havido a vacância de herança[9] (quase nunca acontece na prática), o inventário poderá ser intentado, ainda que haja décadas do falecimento.
O que acontecerá é que o imposto a pagar terá a incidência de multa e também de juros. Somente isso. De resto, o inventário transcorrerá normalmente.
5) Conclusões

O prazo para abrir o inventário, é de 2 meses, dentro do qual os Estados não poderão cobrar multa alguma quando da apuração do imposto devido por ocasião do inventário (ITCD).
Ultrapassado esse prazo, os Estados estarão autorizados a cobrar multa sobre o ITCD, mas não estão obrigados a fazer essa cobrança imediatamente após os 2 meses. Aliás, na prática, o prazo tem sido maior.
Há a possibilidade, ainda, de os Estados concederem descontos expressivos a quem pagar o tributo dentro desses 2 meses. Em alguns Estados, este desconto é concedido até mesmo depois dos 2 meses, como é o caso de Minas Gerais (até 90 dias após a morte).
Ainda que se tenham passados todos os prazos, havendo que se pagar a multa e os juros de mora, poderá ser feito o inventário dos bens deixados pelo (a) finado (a), mesmo que se tenham passado décadas, desde que a herança não tenha sido declarada vacante[10].
Obs.: Caso tenha sanado suas dúvidas e queira começar um inventário, porém não sabe quais documentos precisa, recomendo a leitura complementar deste meu outro artigo.
[1] Em minha opinião, parece que falta a muitos colegas o profundo conhecimento sobre o que é de fato a transmissão decorrente da morte, o que significa o inventário, qual a razão da cobrança do imposto incidente (fato gerador), e quais são as competências da União e dos Estados.
[2] Não, 2 meses não significam 60 dias. Devemos nos lembrar dos meses com 31 dias, do mês de fevereiro, e, ainda, dos anos bissextos. Portanto, a contagem incorreta do prazo, ao se presumir que 60 dias equivale a 2 meses, pode gerar consequências drásticas, como, por exemplo, perda de descontos no imposto que incide sobre o inventário, ou mesmo a penalização com multa. Por isso, faço questão de frisar essa diferença, que passa longe de ser mero detalhe ou preciosismo técnico, eis que é o cliente que sentirá no bolso o cálculo temporal errôneo.
[3] Isto é, não formado em Direito.
[4] “Art. 1.796. No prazo de trinta dias, a contar da abertura da sucessão, instaurar-se-á inventário do patrimônio hereditário, perante o juízo competente no lugar da sucessão, para fins de liquidação e, quando for o caso, de partilha da herança.”
[5] “Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte.”
[6]“Art. 13. O imposto será pago:
I- na transmissão causa mortis, no prazo de cento e oitenta dias contados da data da abertura da sucessão;”
[7] Não há, desse modo, qualquer incompatibilidade entre oCódigo de Processo Civil e a Lei do Estado de Minas Gerais. Bem ao revés, esta complementa aquela.
[8]Decreto Estadual nº. 43.981/05:
“Art. 23. Na transmissão causa mortis, observado o disposto no § 1º deste artigo, para pagamento do imposto devido será concedido desconto de 15% (quinze por cento), se recolhido no prazo de 90 (noventa) dias, contado da abertura da sucessão.”
[9] Essa situação de vacância da herança, por ser excepcional, será tratada em outro artigo.
[10] Cf. Nota de rodapé nº. 09.
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